Rara Calma
Uma das coisas que eu detesto em não ter superpoderes é de não conseguir remover o sofrimento das pessoas num passe de mágica.
Sabe quando uma criança está chorando desesperadamente e corre em busca da mãe ou de qualquer pessoa que ela possa se jogar nos braços para se desmanchar em lágrimas?
Na vida adulta acontece igual, mas diferente. Se você é adulto e ainda não teve seu momento de choro em posição fetal, prepare-se.
Quando crescemos nossos arranhões e machucados acontecem de várias formas e nos damos conta que as feridas não são abertas somente de maneira física. Não existe um Mertiolate para curar um coração partido, por exemplo.
E nada nos prepara para determinados machucados metafísicos do que vivenciá-los e buscarmos curá-los por nós mesmos. Quero dizer, é claro que existem métodos palhativos para a alma, como terapia, ou religião ou outras formas, mas a cura do que não é palpável não pode ser mensurada.
Uma cicatriz na sua pele quer dizer que a ferida está fechada e se curou. Quando sabemos que uma alma está curada?
Penso que a cura para essas feridas são necessárias para que nos tornemos mais humanos no sentido de nos colocarmos em perspectiva com a grandiosidade da natureza. Quando sofremos parece que, de fato, todas as partículas deste vasto universo estão conspirando contra nós, ou querendo nos dar uma lição.
Não acho isso errado.
Para dar um exemplo, ano passado tive uma das maiores feridas da alma — vou falar da alma porque é aquilo que não fere a carne — que foi meu divórcio. Independente de se abrir uma ferida pode ser bom para sua vida, as sequelas e cicatrizes permanecem. E como eu já falei em outro texto, curar é sempre mais doloroso do que causar a ferida.
Lembra daquele cara que se perdeu em uma trilha, ficou com o braço preso e teve que serrar o próprio braço para sobreviver? Se ele não fizesse isso, morreria. Se salvou, mas permaneceu sem um braço.
Mas o ponto do texto não é esse.
O ponto é que, indepentende de quão profundas essas feridas da alma são, a única forma de curá-las é de forma muito paradoxal, é aceitá-las e abraçá-las como parte de um processo.
E eu fico puto com isso, porque eu realmente gostaria de chegar perto das pessoas que eu amo que estejam sofrendo, dar uma esfregadinha nas mãos e PLUF, xô sofrimento, xôoo preguiça, xôoo feiura! Feiura não, não tem o que fazer com gente feia.
A única coisa que eu posso oferecer é a minha atenção e intenção. Ser um amigo.
Na minha viagem tive bastante tempo de refletir enquanto dirigia, via as paisagens e a grandiosidade da natureza. Pensei em cada amigo, familiar, pessoas próximas que estão passando ou passaram por momentos de angustia.
Bom. Tenho certeza de que vai ficar tudo bem. Tudo fica. Até agora, tudo ficou.
Mas que eu queria ter esse superpoder, eu queria.



