Se você acompanha meu Instagram por algum tempo, deve ter lido a história que vou contar neste texto. É uma história sobre como eu trouxe uma réplica de um barco espanhol em diversos vôos internacionais, sem quebrar.
Para dar um pouco de contexto, no último dia da minha viagem ao Canadá, decidi comprar alguma lembrança para meu apartamento. Na rua Locke, tem uma loja de antiguidades que aparentava ter boas possibilidades.
Minha amiga, Jéssica, me acompanhou até a loja faltando, aproximadamente, uma hora antes de eu pegar o ônibus para o aeroporto de Toronto. Era a última chance de comprar uma lembrança.
Exploramos a loja em busca de alguma coisa. Avistei um barquinho simpático. Sempre curti a ideia de como barcos representam uma boa parte das descobertas do mundo, nem todas agradáveis, claro, mas mesmo assim, uma forma de tecnologia incrível para que toda a sociedade chegasse no que é hoje.
O barco que vi era pequeno, do tamanho de um tablet. Tinha alguns detalhes bonitos feitos a mão. Quando me dirigia ao caixa para pagar, a Jéssica gritou lá do porão: “PEEEDROOOO, VOCÊ VIU ESSE AQUI!?!?! ?!”
Ela sobre a escada com um barco de madeira imenso, super detalhado e disse; “Você tem que levar esse!! Perguntei o preço e de fato, valia muito a pena. Nossos olhos brilharam como as de caçadores de tesouros que encontram as relíquias mais preciosas.
Comprei.
Passando pela porta de saída da loja, um sopro de racionalidade nos fez pensar algo muito importante: “Como vou levar essa coisa pra casa?”
— Eu não sei, mas se você conseguir, vai ser algo muito legal! — Disse minha amiga ainda incrédula da irresponsabilidade que teve em sugerir a compra.
Voltamos pra casa dela e de seu esposo, Brad, que ao ver eu chegando com aquele barco, gargalhava. Eu podia traduzir o riso e ver estampada na cara dele a frase: “Se fodeu HAHAHAHA”.
Documentei a jornada em forma de atos, que você lerá abaixo.
A viagem do Navio em 4 atos
Ato I - Toronto - Washington
Cheguei no guichê de check-in com minha mala, uma mochila e uma sacola com meu barco dentro. Olhei para a atendente com uma cara de cão arrependido e solicitei ajuda, pois o barco era uma peça muito importante na minha família, passada por gerações, que eu tinha acabado de recuperar para que se mantivesse em minha família.
A moça me disse que eu poderia pedir para embarcar primeiro e colocar em algum lugar. Consegui embarcar por último.
Quando embarquei, a comissária disse: isso aí não vai caber em lugar nenhum não.
Respondi dizendo que era uma lembrança importante e que eu não poderia deixar para trás. Uma gentil mulher, sentada na primeira fileira removeu as coisas dela do espaço de cima.
Meu problema seria se o barco não coubesse no compartimento. Para minha sorte, coube.
O barco dividiu espaço com algumas mochilas pesadas.
Quando o avião acelerou para levantar voo, ouvi as mochilas da parte superior se arrastando. A única coisa que pensei foi no maldito Newton que inventou as leis.
Ato II - Washington- São Paulo
Depois de conhecer o Scot, meu vizinho de assento que me perguntou se eu me importava com ele ficar cuspindo numa garrafa por causa do seu vício em mascar fumo, pousamos em Washington.
Me apressei para ver como estava o estado do barco. Felizmente, poucas avarias aconteceram. O mais importante é a base e os mastros principais.
Peguei a sacola e me apressei para o portão de embarque do próximo voo.
Era um avião maior, então pensei que o bagageiro acima dos assentos seriam de tamanho suficiente. Não eram.
Foi interessante ver o olhar de todas as pessoas ao me ver com aquela sacola com um barco dentro.
Ao ver minha dificuldade, uma comissária chamada Erin fez a gentileza de o colocar em algum lugar propício. Quando perguntei como faria para recuperá-lo no final do voo, ela disse: "Na saída é só dizer que você é dono do barco, todo mundo aqui tá sabendo do que se trata."
Ato III - São Paulo - Curitiba
No voo anterior conversei brevemente com a Ana Carolina. Me contou que estava passeando com um grupo de amigos pelos EUA. Ela tinha umas tatuagens legais. Ela puxou conversa perguntando se o barco era algum tipo de herança.
Conversamos por pouco tempo e logo caí no sono.
Descobri que ela é médica. Em algum momento do voo anunciaram que precisavam de um doutor ou doutora. Quase me prontifiquei mas entendi que era por causa de uma passageira passando mal.
A Ana levantou e foi ajudar a moça.
Foram nove horas de voo. Nos intervalos, entre um cochilo e outro, eu acordava e via a Ana dando suporte pra moça doente.
Se fosse doutora em matemática não teria esse trabalho todo.
Chegando em São Paulo peguei o barco. Fui para o próximo portão de embarque.
Peguei o último assento do avião e dei sorte de não ter ninguém do meu lado. Ou alguém deu sorte de eu não ser a pessoa ao lado.
Coloquei o barco embaixo do banco e voamos.
Ato IV - Curitiba - Guarapuava
Último trecho da viagem. Agora só faltava eu ir até a rodoviária, esperar o ônibus e chegar em casa.
No entanto, tenho uma amiga muito querida e colega de trabalho que havia muito tempo que não conversava. Marcamos um café em um lugar muito bacana. Ganhei um livro de presente. Fofocamos.
O tempo passou muito rápido e peguei um Uber para a rodoviária.
Quando escolhi o assento do ônibus, utilizei uma técnica que raramente falha. Se o ônibus estiver meio vazio, sempre escolho a poltrona 23. Ela fica no meio do ônibus, isso faz com que a probabilidade de morte por acidente seja reduzida e, no Brasil, existe um estigma muito grande em torno do número 24. Homens dificilmente escolhem essa poltrona, fazendo a probabilidade de uma garota sentar ao meu lado, ou ficar sozinho em uma fila com dois bancos aumentar.
Foi o que aconteceu. Consegui deixar o barco ao lado dos meus pés, ninguém reservou a poltrona ao lado.
Chegando na minha cidade, uma amiga me deu uma carona até em casa.
Voilà, eis a história de como eu trouxe um barco de uma casa de antiguidades da rua Locke, em Hamilton no Canadá, pra uma cidade do interior do Brasil.
Valew por ler até aqui. Se você gostou desse texto e quer receber minhas histórias diretamente na sua caixa de e-mail, considere ser uma assinante. Só clicar no botão abaixo.