Me despedi da cabana e dos cachorros que me adotaram nos últimos dois dias. Quando acordei, por causa do cachorro que latia para os cavalos da propriedade, vi que as nuvens cobriam o vale.
Os cavalos, em sua maior paz existencial, apenas ignoravam o cachorro como se o canino estivesse falando groselhas irritantes. Pelo menos pra mim foi um pouco irritante, logo pela manhã esse estardalhaço. Tentativa de comunicação falha da parte do cachorro, sugiro que comece algum curso de cavalês.
Arrumei as malas, lavei a louça e fechei tudo. É um ótimo lugar para passar alguns dias e ficar no silêncio. A cabana tem um teto onde uma parte dele é de vidro onde fica uma cama embaixo. Fiquei admirando as estrelas na noite anterior.
Meu próximo destino seria Balneário Gaivota, onde a Tânia e a Sabrine moram e estavam me esperando para a noite. Eu tinha bastante tempo para chegar, então fui em um café que me indicaram em Urubici fazer um brunch.
O lugar se chama, Gênesis.
Um café simpático, com detalhes de decoração grega. O lugar foi criado por um casal que deve estar bastante envolvido com alguma coisa de igreja. Tava tocando música gospel e tinha um recadinho na última página do cardápio que era mais ou menos assim: “No caixa tem uns papeizinhos que você pode deixar uma oração, um pedido, e se precisar conversar, nos chame, você não está sozinho”.
Achei bonito. Mas não liguei muito.
Lá também estava um casal. Éramos os únicos clientes naquela manhã. Enquanto eu lia meu livro, esperando meu pedido ser preparado, notei que o rapaz do casal se levantou e foi até o caixa para escrever em um daqueles papéis.
Seus olhos marejados eram indisfarçáveis. Voltei minha atenção para o livro, mas minha cabeça logo refletiu, se perguntando o porquê do rapaz estar chorando. Era de alegria? De tristeza? De dor no mindinho porque o tênis estava muito apertado? Era porque tava apimentando demais e ele não conseguia falar e precisou escrever no papel?
Nunca vou saber, e também não me dei o trabalho de perguntar. Se for por causa de algum tipo de problema, espero que fique bem.
Terminei meu café da manhã e peguei a estrada. Mal sabia que aquele pequeno momento de flagrante do choro alheio acompanharia minha mente por praticamente o dia todo. Viajar sozinho dá a oportunidade de conversar muito em silêncio consigo mesmo, sobre tudo.
Minha próxima parada foi na cascata do avencal. Uma cachoeira que tem muitos metros de altura — to com preguiça de buscar a informação aqui — onde as pessas acham muito legal se jogar lá de cima com um cabo de aço.
Três segundos de queda livre, disse o rapaz, ainda tremendo, que tinha acabado de saltar perguntando se eu iria. Disse pra ele que eu morreria de susto e que não tinha fraldas o suficiente para fazer aquele pulo. É sério, se eu fizer um rolê desse eu perco controle de todos os fluídos corporais: lágrimas, urina e bosta. Além de um possível desmaio, porque entre o segundo 1 e 3 de queda livre eu estaria desacordado.
Então, prefiro manter a compostura e só tirar umas fotos mesmo. Também fiz umas imagens de drone.
Saindo dali, rumei para a Serra do Rio do Rastro. As curvas da estrada e as paisagens começaram a engatilhar pensamentos intrusivos bastante perigosos. Quando lembrei do rapaz chorando, pensei que cada pessoa tá lutando suas batalhas e sofrendo na sua própria individualidade. E é quase todo mundo.
Eu também tenho as minhas, mas atualmente, todos os meus problemas que ocupam boa parte da minha cabeça foram criados por mim mesmo, onde a solução seria fácil: Desistir de todos os frutos que esses problemas podem trazer, sejam eles bons ou ruins.
Pra que ter uma casa própria quando você pode viver viajando o mundo até o fim dos seus dias, né? — Eu sei a resposta, mas é esse tipo de pensamento que me ocorre.
Chegando no mirante da serra, fiquei espantado com a magnitude de sua beleza. Ficar olhando para horizontes me mostra como sou pequeno. E a estrada sinuosa estava alí, só esperando para eu percorrê-la ouvindo uma boa música.
Quem gosta de dirigir entende o sentimento. Tirei umas fotos dos gigantes e dos guachinins. Voltei para o carro, liguei o motor dois ponto zero com filtro esportivo e escape furado, dei duas aceleradas e desci a serra no veneno, pipocando e fazendo drift em cada curva — na minha imaginação.
Se não podemos viver as alegrias ou tristezas das escolhas que não fazemos, naquele instante eu escolhi a alegria de acelerar serra abaixo.
Foi muito divertido.
Parei para pegar informações e mais um carimbo no meu passaporte biker. Verifiquei que existe mais um monumento que desviaria minha rota uns sessenta quilômetros e decidi almoçar no lugar. Passei por uma cidade chamada, Nova Veneza. Fiquei curioso nos pontos turísticos, mas preciso viajar com mais tempo.
Chegando no monumento biker, o restaurante estava fechado. Quando resolvi ir embora o dono apareceu e fez uma porção de tilápia para eu comer.
Enquanto ele preparava, fui molhar os pés no rio que fica atrás do restaurante. É um ótimo lugar para quem gosta de fazer camping. Quase perdi o meu drone nesse riacho.
Próximo do meu horário de chegar na casa das minhas amigas, paguei o sr Alexandre, dono da pousada, e embarquei no carro. Acho que eu preciso achar um nome para o carro, para dar um elemento narrativo mais interessante para minhas viagens. Aceito sugestões.
Quando cheguei, a Sabrine estava preparando uma janta muito gostosa enquanto a Tânia terminava de atender uma pessoa no trabalho dela.
Jantamos, bebemos vinho, conversamos e rimos muito.
Até o próximo!
Para ler os outros registros da viagem acesse:
The Roadtrip 2025 - Diário de Bordo
Para entender a importância ou o porquê de eu dedicar parte do meu tempo para documentar a viagem que estou prestes a fazer, assista aos vídeos ou filmes que deixarei no final desta publicação. Bora para o diário de bordo.